De como o COAF começou a suspeitar da movimentação de dinheiro no caso Vale

Saques milionários das contas da mineradora e depósitos vultosos em contas de advogados e seus familiares chamaram a atenção do órgão que controla atividades financeiras

 

SAQUE MILIONÁRIO. Wolmer Araújo e Arão Mendes sacaram R$ 9 milhões das contas da Vale, operação vista como suspeita pelo COAF

Análise da Notícia

Aberto em 2009, o processo dos advogados Wolmer Araújo e Arão Mendes contra a mineradora Vale – denunciado no fim de semana pela revista Piauí – só teve a primeira movimentação financeira efetiva em 2015, após idas e vindas nas várias instâncias da Justiça:

  • em 2012 a juíza da 5ª Vara Cível não viu prejuízos aos supostos pescadores e negou indenização e pensão;  
  • no recurso ao Tribunal de Justiça, a desembargadora Nelma Sarney mudou a sentença e estabeleceu a pensão;
  • estranhamente, a decisão mandava a Vale pagar R$ 5,6 milhões na conta dos advogados e não nas dos pescadores; 
  • a Vale ainda conseguiu derrubar a sentença no STJ, mas o TJ-MA mudou o processo para a Vara de Interesses Difusos;
  • em 2015, Wolmer e Arão conseguiram alvará para sacar – agora R$ 8,3 milhões e correção – e não mais R$ 5,6 milhões. 

Foi exatamente neste momento que a operação entrou no radar do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf); no dia 31 de março de 2015, Volmer Araújo e Arão Mendes foram pessoalmente a uma agencia do Banco do Brasil e sacaram, de uma só vez, R$ 9 milhões, equivalentes aos R$ 8,3 milhões mais a correção monetária.

“Aconteceram, a partir desse momento, movimentações que o Coaf considerou atípicas. Dos 9 milhões de reais, 7,1 milhões foram repassados para uma conta de Nívea Azevedo, a mulher de Wolmer. Outro milhão foi transferido para um advogado chamado Frederico de Abreu Silva Campos [Fred Campos, atual prefeito de Paço do Lumiar]. O pai de Frederico, na época, era assessor do então deputado estadual Edilázio Gomes da Silva Júnior (PSD-MA) – que, por sua vez, é genro da desembargadora Sarney Costa. Os 900 mil reais restantes foram repassados, por meio de cheques, para dois irmãos, Arnaldo e José Helias Sekeff do Lago, este último lotado no gabinete de Edilázio”, conta a revista Piauí, que trouxe o escândalo à tona. (Leia aqui a reportagem completa)

Foi a partir desta movimentação que o COAF entrou na história e passou a monitorar os envolvidos; descobriu, por exemplo, que alguns dos personagens já estavam indiciados pela Polícia Federal por envolvimento em caso parecido, contra o Banco do Nordeste do Brasil.

Os documentos foram encaminhados pelo COAF à Receita Federal e à Polícia Federal.

E devem render novas operações contra o que a PF chama de Organização Criminosa…

Desembargador Luiz Gonzaga rechaça envolvimento com venda de sentença no TJ-MA

Em Nota de Esclarecimento encaminhada a este blog Marco Aurélio d’Eça, magistrado disse que teve participação apenas pontual no caso envolvendo a mineradora Vale, revelado pela revista Piauí

 

QUEBRANDO O SILÊNCIO; Luiz Gonzaga Almeida Filho resolveu contestar envolvimento do seu nome em novo caso suspeito de venda de sentenças

O desembargador Luiz Gonzaga Almeida Filho encaminhou a este blog Marco Aurélio d’Eça Nota de Esclarecimento em que “rechaça veementemente qualquer insinuação de envolvimento com organização criminosa”; o magistrado nega envolvimento tanto no caso do Banco do Nordeste quanto no caso Vale.

“No caso específico mencionado na reportagem, tive apenas duas participações pontuais: a primeira, quando respondia pela 5ª Vara Cível de São Luís, limitando-me a cumprir decisão do próprio Tribunal de Justiça do Maranhão, no âmbito do cumprimento de sentença; a segunda, já como desembargador, compus quórum em julgamento colegiado, tendo apenas acompanhado o relator do recurso”, explicou Luiz Gonzaga.

  • reportagem da revista Piauí mostrou que os mesmos personagens que atuaram no caso BNB também atuaram no caso Vale;
  • a matéria revela que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) começou a investigar movimentações no caso Vale.

A matéria da revista Piauí foi comentada por este blog Marco Aurélio d’Eça e reproduzida via link no post “De novo a quadrilha de venda de sentenças no TJ-MA…”; o termo “quadrilha” é um sinônimo de “Organização Criminosa”, utilizada pela Polícia Federal para classificar o grupo que agiu no Caso BNB. (Relembre aqui)

Como ele mesmo confirma em sua nota, Luiz Gonzaga é citado em duas situações pela revista Piauí:

  • na primeira, a revista revela que ele, ainda na condição de juiz, acatou um pedido incomum dos advogados Volmer Araújo e Arão Mendes e determinou que os dois – e não os pescadores supostamente vítimas – recebessem dinheiro de indenizações da Vale; (Leia a íntegra aqui)
  • na segunda citação, a Piauí diz que Luiz Gonzaga, já na condição de desembargador, acompanhou o colega Guerreiro Júnior em votação para impedir que o caso Vale fosse investigado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

“Assim como no caso anterior, objeto de investigação pela Polícia Federal – que sequer identificou qualquer atuação minha com o intuito de prejudicar o Banco do Nordeste – todas as minhas decisões observaram rigorosamente a legalidade e os limites do cargo, sem qualquer benefício pessoal. Reitero, igualmente, que nunca recebi quaisquer valores pelos beneficiários de recursos dessas empresas”, garante Luiz Gonzaga Almeida Filho.

O desembargador explica que preferiu o silêncio, “mesmo diante de medidas extremas” contra si, mas que não podia ficar calado “diante de insistente tentativa de exposição” indevida de sua imagem.

Abaixo, a íntegra da nota de esclarecimento assinada pelo desembargador:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

A respeito da matéria publicada pela revista Piauí, que começou a circular nesta sexta-feira, 04 de abril, e pelo jornalista Marco Aurélio D’Eça, venho a público esclarecer e rechaçar veementemente qualquer insinuação de meu envolvimento com organização criminosa ou com suposta venda de sentenças, seja no caso que envolve o Banco do Nordeste, seja no processo judicial em que figura a mineradora Vale.

No caso específico mencionado na reportagem, tive apenas duas participações pontuais: a primeira, quando respondia pela 5ª Vara Cível de São Luís, limitando-me a cumprir decisão do próprio Tribunal de Justiça do Maranhão, no âmbito do cumprimento de sentença; a segunda, já como desembargador, compus quórum em julgamento colegiado, tendo apenas acompanhado o relator do recurso.

Assim como no caso anterior, objeto de investigação pela Polícia Federal – que sequer identificou qualquer atuação minha com o intuito de prejudicar o Banco do Nordeste – todas as minhas decisões observaram rigorosamente a legalidade e os limites do cargo, sem qualquer benefício pessoal. Reitero, igualmente, que nunca recebi quaisquer valores pelos beneficiários de recursos dessas empresas.

Mesmo diante de medidas extremas, como meu afastamento das funções, e de ataques públicos que antecipam julgamento, optei por manter o silêncio, por respeito às instituições e à própria investigação.

No entanto, diante da insistente tentativa de exposição indevida da minha imagem, considero necessário reafirmar:
“Sigo firme no propósito de provar que não participo e nunca participei de qualquer organização criminosa. Sou magistrado há 44 anos, sempre abnegado e compromissado com um cargo que tanto lutei para exercer com dignidade, respeito e discrição.”

Confio que o tempo e a verdade se encarregarão de colocar cada fato em seu devido lugar, restabelecendo minha honra e demonstrando a correção das minhas condutas ao longo de toda a minha trajetória na magistratura.

São Luís (MA), 07 de abril de 2025.
Desembargador Luiz Gonzaga Almeida Filho