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Allan Garcês quer convocar ministra da Saúde por divulgação de informação sobre cloroquina…

Deputado federal maranhense, que é médico, contestou a afirmação de estudo realizado por médicos da França e do Canadá – divulgado pelo ministério e pela agência de notícias do Governo Lula – que apontou 17 mil mortes causadas após uso de hidroxicloroquina durante a pandemia de coronavírus; ele pretende levar o caso à Comissão de Saúde da Câmara federal

 

O banner do Ministério da Saúde, com informações sobre o estudo e o alerta “Fake News Mata” contestado por Allan Garcês

O deputado federal Allan Garcês (PP) classificou de leviana a informação repassada pelo Ministério da Saúde e pela Agência Brasil (EBC) sobre estudo de médicos franceses e canadenses apontando o uso de Cloroquina como a causa de mais de 17 mil mortes durante a primeira onda da pandemia de coronavírus, em 2020.

– Meus Deus, que afirmação leviana é esta do Ministério da Saúde em dizer que mais de 17 mil pessoas morreram por que tomaram a cloroquina durante a Pandemia de covid-19? Esta afirmação tem um viés militante ideológico e um poder destrutivo de disseminar uma espécie de pavor em pacientes que fazem uso contínuo deste medicamento – alertou Garcês.

O estudo franco-canadense, publicado com ressalvas no periódico científico Biomedicine & Pharmacotherapy, foi divulgado esta semana em diversos veículos comunicação e portais de notícias; o Ministério da Saúde fez banner com a informação e a Agência Brasil, ligada ao Governo Federal, publicou a matéria. (Saiba mais aqui)

– Como Deputado Federal mais uma vez irei entrar com outro requerimento pedindo esclarecimento e responsabilizando o Ministério da Saúde por disseminar desinformação e possível pavor nos brasileiros que usam este medicamento – afirmou Garcês.

Allan Garcês quer convocar a ministra da Saúde para dar esclarecimentos à Comissão de Saúde da Câmara 

De acordo com as publicações na imprensa, os cientistas da França e do Canadá analisaram dados da hospitalização em seis países, com pacientes que haviam sido expostos ao medicamento, usado originalmente para Malária.

– Como  titular da Comissão de Saúde da Câmara Federal irei requerer a convocação da ministra da Saúde para prestar esclarecimentos sobre isso – concluiu Allan Garcês.

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Parecer técnico da SES desautoriza cloroquina a pacientes de coVID-19

Documento assinado por membros da “Comissão de Infectologia Assessora do Governo do Estado” põe em xeque declarações do secretário Carlos Lula e do próprio governador Flávio Dino, que passaram a falar do uso do medicamento a pacientes leves; autores recomendam retirada do composto do protocolo de tratamento

 

Comissão que assessora o governo Flávio Dino não recomenda uso da cloroquina nas fases iniciais da doença, e desautoriza sua inclusão no protocolo da Secretaria de Saúde

O “Parecer Técnico Sumário sobre Uso de Cloroquina/hidroxicloroquina e Azitromicina na Terapia Precoce da CoVID-19, de autoria da Comissão de Infectologia assessora da Secretaria Estadual de Saúde do Governo do Estado do Maranhão”, aumentou a polêmica sobre o uso das substância no tratamento de vítimas do coronavírus no Maranhão.

O documento, assinado por cinco especialistas, e timbrado pela Vírion Infectologia – que assessora diretamente a Secretaria de Saúde no combate à doença – faz uma série de análises e, ao final, desautoriza o uso do composto.

– Pelo exposto acima, NÃO recomendamos formalmente o uso de cloroquina/hidroxicloroquina, com ou sem azitromicina, para casos confirmados de COVID-19 que apresentem sintomas leves e em fase precoce. Ademais, face às evidências mais recentes, deliberamos a retirada da recomendação para uso da mesma em protocolo para pacientes internados – conclui o documento.

A conclusão da comissão, encaminhada nesta segunda-feira, 18 ao comando da SES e do governo – e que o blog teve acesso nesta terça-feira, 19 – põe em xeque declarações do secretário Carlos Lula e do próprio governador Flávio Dino, que passaram a admitir o uso da cloroquina nas fases iniciais da doença, após meses de críticas à postura de quem pregava o uso da substância.

Talvez por esta recomendação é que Flávio Dino e Carlos Lula chegaram a publicar em suas redes sociais a defesa do uso da cloroquina, mas as retiraram em seguida, eliminando também da pagina do Governo do Estado.

O parecer técnico é assinado pelos médicos  Ana Cristina Rodrigues Saldanha, Infectologista e Profª. Drª. da Universidade Federal do Maranhão (UFMA); Bernardo Bastos Wittlin, Infectologista do Hospital Universitário da UFMA; Conceição de Maria Pedrozo e Silva de Azevedo, Infectologista e Profª. Drª. da Ufma; Elza Carolina Cruz Sousa Barros, Infectopediatra do Hospital Universitário da UFMA; Eudes Alves Simões Neto, Infectologista e Professor Especialista da Ufma; e Mônica Elinor Alves Gama, Pediatra e Profª. Drª. da Ufma. 

Abaixo, a íntegra do Parecer da Víriom Infectologia:

Vírion Infectologia

18 de maio de 2020

Parecer técnico sumário: uso de cloroquina/hidroxicloroquina e
azitromicina na terapia precoce da COVID-19

Comissão de Infectologia assessora da secretaria estadual de saúde do
Governo do Estado do Maranhão

1) Autores:

Ana Cristina Rodrigues Saldanha1, Bernardo Bastos Wittlin2 Conceição de Maria Pedrozo e Silva de Azevedo3, Elza Carolina Cruz Sousa Barros4, Eudes Alves Simões Neto5 e Mônica Elinor Alves Gama6

1. Infectologista e Profa Dra da Universidade Federal do Maranhão (UFMA); 2. Infectologista do Hospital Universitário da UFMA; 3. Infectologista e Profª. Dra. da Universidade Federal do Maranhão; 4. Infectopediatra do Hospital Universitário da UFMA; 5. Infectologista e Prof. Esp. da Universidade Federal do Maranhão; 6. Pediatra e Profa. Dra. da Universidade Federal do Maranhão

2) Conflitos de interesse:

Os autores não declaram conflitos de interesse.

3) Contexto:

A COVID-19 é uma doença respiratória aguda causada pelo coronavírus SARSCoV-2 e identificada pela primeira vez em Wuhan, na província de Hubei, China, em dezembro de 2019. O primeiro caso no Brasil foi detectado em fevereiro de 2020. Em março de 2020, a OMS definiu o surto como pandemia. À elaboração do presente documento, há mais de 241.000 casos e 16.000 mortes confirmadas no Brasil.

Até o momento, não existe droga comprovadamente eficaz contra a doença. Inúmeros fármacos, incluindo alguns utilizados para outras condições médicas, estão sendo reposicionados e objetos de ensaios clínicos e estudos observacionais, dentre eles, a cloroquina e seu derivado hidroxicloroquina. Diversos países, incluindo o Brasil, liberaram seu uso como terapia experimental e/ou compassiva para pacientes graves.

4) Introdução:

A cloroquina/hidroxicloroquina (CQ/HCQ) é um medicamento antimalárico antigo, utilizado há décadas não apenas no tratamento da malária, como em doenças reumatológicas, devido às suas ações imunomodulatórias. Tem perfil de segurança conhecido no tratamento das populações afetadas pelas referidas doenças, sendo considerada uma droga relativamente segura nestas mesmas, sem dispensar determinadas precauções.

Dentre os efeitos adversos de maior destaque, estão o aumento do intervalo QT (com risco de graves arritmias), retinopatia, anemia, leucopenia, trombocitopenia, hemólise em indivíduos com deficiência de G6PD, náuseas, vômitos, diarreia, dor abdominal, entre outros.  Utilizando o acrônimo PICO para o levantamento dos estudos científicos que respondam à intervenção proposta, poderíamos expor a busca conforme as tabelas abaixo:

Uso de CQ/HCQ na fase precoce da COVID-19.

População-alvo/Intervenção/Comparativo/Outcome (desfechos)

Pacientes, acima de 18 anos, que apresentem diagnóstico de COVID-19, estando nos primeiros 7 dias dos sintomas, com ou sem critérios de gravidade, com ou sem necessidade de internação:

Hidroxicloroquina (dose: 1º dia: 400mg VO 12/12h; 2º – 5º dia: 400mg 1xd) ou Cloroquina (dose: 1º dia: 450mg VO 12/12h; 2º – 5º dia: 450mg
1xd) +/-

Azitromicina (dose: 500mg VO 1xd por 5 dias)

Pacientes com diagnóstico confirmado de COVID-19, que receberam, preferencialmente, tratamento semelhante ao dos grupos expostos, a exceção da intervenção proposta

Mortes por COVID-19, necessidade de ventilação mecânica, clearance viral, tempo de internação hospitalar, melhora dos sintomas, melhora da imagem radiológica.]

Frisa-se que os estudos clínicos considerados a seguir encontram-se listados em revisões de evidências elaboradas pelo Ministério da Saúde e pela Organização PanAmericana de Saúde.

Desta forma, fiamo-nos nas estratégias de busca, seleção de estudos, bem como, nas análises de qualidade metodológica destes documentos oficiais.

5) Revisão histórica das evidências:

Estudos in vitro com células Vero E6 (de rins de macaco verde) demonstraram que a HCQ tem ação antiviral, provavelmente decorrente da inibição do transporte intracelular do vírus, ao alcalinizar o interior dos endossomos e, possivelmente, por inibição da glicosilação do receptor de entrada ACE2 pelo vírus 1.

Outros estudos demonstraram atividade antiviral in vitro contra diversos vírus RNA, como HIV, vírus da raiva, ebola, Influenza, dengue, chikungunya, vírus das hepatite A e B 2; 3. Já quando utilizada em modelos animais, a droga não demonstrou benefício para ebola 4 , Influenza A, SARS-CoV-1 5 e chikungunya 6, com efeito contrário e amplificação da infecção por este último. Em contraste, houve resultados favoráveis para ZIKV 7 e gripe aviária 8.

Digno de nota, em estudo recente preprint (ainda não avaliado por pares), testando macacos experimentalmente infectados por SARS-CoV-2, nem a HCQ isolada, nem a combinação HCQ-AZM mostraram redução significativa da carga viral; ademais, em contraste com a inibição in vitro do vírus em células Vero E6, não se observou o mesmo efeito em modelo reconstituído de células de epitélio humano 9.

Em março de 2020, um estudo clínico francês de Gautret et al. 10, apresentado como “ensaio clínico não-randomizado” e aberto, despertou a atenção por mostrar significativo encurtamento de clearance viral nasal no 6º dia de doença, em pacientes que utilizaram HCQ (n=20; 57,1%), HCQ com azitromicina (n=6; 100%), comparado com o controle (n=16; 12,5%).

Dentre as grandes limitações apontadas no estudo estão: amostra reduzida aquém do cálculo projetado, perda de seguimento no grupo que fez uso de HCQ (incluiu 3 pacientes que foram para UTI), ausência de randomização, cegamento e placebo, além da definição dos controles (pacientes que se recusaram a tomar a droga e manejados em outro centro diferente do grupo com medicação).

Em contraste, Molina etal. 11 reportaram uma série de 10 pacientes que utilizaram HCQ, 8 deles permanecendo com PCR em swab nasal positivo nos dias 5 a 6 de doença. A ausência de grupo controle e o reduzido número de pacientes estão entre as notórias limitações do estudo.

Em abril de 2020, Chen Z et al. 12 apresentaram um ensaio clínico, na condição de preprint, tendo 31 pacientes sido tratados com HCQ e 31 não. Demonstrou menor tempo para remissão da febre e da tosse (média de dias 2,2 vs 3,2, p=0.0008), além de melhora evolutiva das imagens de tomografia (80,6% vs 54,8%) no grupo que usou HCQ.

Dentre as limitações apontadas no estudo: amostra relativamente pequena, falta de clareza quanto ao cegamento, ausência de placebo e ausência de descrição da gravidade basal entre os grupos para avaliar se eram comparáveis. Em outro ensaio clínico piloto, Chen J et al. 13, comparando 15:15 pacientes, não encontraram diferenças significativas para negativação de PCR de swab nasal, duração da hospitalização, remissão da febre e evolução radiológica. Pesquisadores concluíram que a dose padrão de HCQ não mostrou efeitos na melhora dos sintomas do paciente e na aceleração supressão virológica.

Dentre as limitações deste último, destacam-se a amostra pequena, não-cegamento e ausência de placebo.

Em documento de revisões sistemáticas sumárias de 08/05/2020, a OPAS 14 avaliou os estudos clínicos supracitados, num levantamento que reuniu 6 ensaios clínicos e 15 estudos observacionais envolvendo o uso de CQ/HCQ na COVID-19. A grande maioria dos estudos, segundo o documento, apresentou alto risco de vieses e muito baixo a baixo nível de certeza, a exceção do ensaio clínico de Silva Borba et al. 15, classificado como baixo-moderado risco de vieses e moderado grau de certeza.

Neste estudo, desenhado para comparar CQ em dose padrão com CQ em dose maior, como proposta por guideline chinês, houve elevada letalidade no último grupo (11 mortes), contraindicando dose maior.

Em maio de 2020, dois grandes estudos observacionais realizados nos EUA foram publicados. Geleris et al. publicaram uma coorte com 1446 pacientes, comparando pacientes que foram tratados (n=811 de 1376 incluídos) ou não com HCQ, com foco no desfecho composto de morte ou intubação orotraqueal. Pacientes tratados com HCQ estavam mais gravemente doentes no início do que aqueles que não receberam o medicamento. No geral, 346 pacientes evoluíram para os desfechos primários.

Na análise dos dados brutos (não ajustada), os pacientes que receberam HCQ tiveram maior probabilidade de ter um evento relacionado ao desfecho primário do que os pacientes que não receberam HCQ (HR = 2,37; IC 95%: 1,84 a 3,02). Na análise ajustada, não houve associação significativa entre o uso de HCQ e o desfecho primário composto (HR = 1,04; IC95%: 0,82 a 1,32).

Baseado nesses resultados, os autores informaram que a orientação clínica no centro médico que executou o estudo foi atualizada, e a recomendação de que pacientes com COVID-19 sejam tratados com HCQ foi removida. Contudo, os autores alertam que, devido ao desenho observacional, esses resultados não devem ser utilizados  como regra para descartar os benefícios ou danos do tratamento com a HCQ.

Por fim os autores concluem que os resultados desse estudo não apoiam o uso da HCQ no momento, fora dos ensaios clínicos randomizados em curso que avaliam sua eficácia. Publicada por Rosenberg et al., outra coorte envolveu 1438 pacientes admitidos em 25 hospitais da região metropolitana de Nova Iorque. As exposições analisadas foram uso de HCQ com azitromicina, HCQ isolada, azitromicina isolada ou nada.

O desfecho primário foi mortalidade hospitalar, tendo como secundários a ocorrência de parada cardíaca e achados anormais no eletrocardiograma (arritmia ou prolongamento do intervalo QT). Após análise ajustada, incluindo para condições preexistentes e gravidade da doença, não foram encontradas diferenças significativas na mortalidade entre os pacientes que receberam HCQ + AZM (HR ajustado = 1,35 [IC 95%, 0,76-2,40]), apenas HCQ (HR ajustado = 1,08 [IC 95%, 0,63- 1,85]) ou AZM isolada (HR ajustado = 0,56 [IC 95%, 0,26-1,21]), em comparação com nenhum dos medicamentos (grupo controle).

Achados anormais de ECG foram mais comuns entre os pacientes que receberam HCQ + AZM e HCQ isoladamente. No entanto, em modelos de regressão logística, não houve diferenças significativas entre os grupos. Em relação às paradas cardíacas, estas foram mais frequentes em pacientes que receberam HCQ + AZM, em comparação com pacientes que não receberam nenhum medicamento, mesmo após análise ajustada (OR 2,13 [IC 95%, 1,12-4,05]).

Os autores concluem, a partir dos resultados obtidos, que o tratamento com HCQ, AZM, ou ambos (HCQ + AZM), em comparação com nenhum dos tratamentos, não foi significativamente associado a diferenças na mortalidade hospitalar.

No entanto, alertam que a interpretação desses achados pode ser limitada pelo desenho observacional utilizado. Ensejando alerta, um estudo16 avaliou alterações do intervalo QT e eventos arrítmicos em 251 pacientes com COVID-19 tratados com HCQ-AZM. Prolongamento do QT ocorreu em paralelo com exposição às drogas, havendo encurtamento incompleto mesmo após cessão. Prolongamento extremo de QT > 500ms, um marcador de alto risco, ocorreu em 23% dos pacientes. Um paciente desenvolveu taquicardia ventricular polimórfica, necessitando cardioversão de emergência e 7 pacientes necessitaram término prematuro da terapia.

Os autores concluíram que a combinação HCQ-AZM prolonga significativamente o intervalo QT, com risco de evolução para torsades de pointes e morte.

Com foco no tratamento em fases mais precoces da doença, um estudo observacional de Million et al. 17, do mesmo grupo francês de Raoult D., foi publicado e envolveu 1061 pacientes que fizeram uso de HCQ + AZM em fase mais precoce da doença.

Foi realizada estratégia de testagem massiva com RT-PCR para inclusão no estudo, sendo incluídos 56 pacientes assintomáticos, contactantes de casos confirmados. A média de idade foi de 43,6 anos, média do início dos sintomas e primeira dose de 6,4 dias e 95% dos pacientes tinham à entrada escore de NEWS baixo (baixa gravidade).

Do total, 47 (4,4%) apresentaram carreamento viral prolongado, 46 (4,3%) evoluíram de forma clinicamente desfavorável e 8 morreram (0,75%); 2,3% reportaram sintomas leves. Os autores concluem que utilizado em fase mais precoce, o esquema é seguro e se associou à baixa mortalidade. Dentre as principais limitações deste estudo está a ausência de grupo controle, o que limita sobremaneira conclusões sobre benefício do tratamento.

Por sua vez, um ensaio clínico aberto chinês de Tang et al. 18 envolveu 150 pacientes, randomizados para uso e não uso de HCQ. A maior parte (99%) apresentava sintomas leves a moderados à entrada, sendo a média de tempo entre o início de sintomas e randomização de 16,6 dias. O desfecho primário foi conversão negativa (RT-PCR) no 28º dia, não sendo observada diferença significativa entre os grupos (85,4% vs. 81,3%).

Dentre as limitações deste, estão: a amostra reduzida, o não cegamento e não uso de placebo, a ausência de testagem mais precoce para conversão negativa e a ausência de avaliação de desfechos clínicos. Em carta ao editor, Konig et al. 19, baseados em dados do COVID-19 Global Rheumatology Alliance registry, reportaram dados de 121 pacientes portadores de doenças reumatológicas infectados por SARS-CoV-2 que já faziam uso basal de HCQ.

Destes, 49,6% necessitaram de internação. Entre 80 pacientes portadores de lúpus eritematoso sistêmico com COVID-19, não houve diferença significativa na frequência de hospitalização e necessidade de suporte ventilatório entre os que faziam e não faziam uso prévio de HCQ. Outro estudo 20 utilizando grande banco de dados de Israel envolvendo 14.520 testados para SARS-CoV-2, não se observou diferenças em termos de taxas de uso de HCQ e colchicina, levantando dúvidas acerca do papel protetivo destas medicações. Entre as limitações, estão o fato de serem dados secundários, incluindo a impossibilidade de saber a indicação, dose e duração do uso das drogas.

No que tange à azitromicina, a hipótese de sua utilidade apoia-se em suas ações imunomodulatórias e possíveis efeitos antivirais in vitro.

No entanto, há uma escassez de estudos clínicos que a avaliem no contexto da COVID-19, a exemplo do estudo limitado de Gautret et al.10. Em estudo de coorte envolvendo pacientes com MERS, não houve encurtamento de clearance viral e redução da mortalidade 21.

6) Discussão/Justificativa:

Como sabido, a maior parte dos fármacos cuja ação benéfica é sugerida por estudos in vitro, ao cabo de estudos clínicos, mostram-se falhos e não são empregados na prática médica. No caso específico da CQ/HCQ para SARS-CoV-2, mesmo sua ação antiviral in vitro e em modelos animais vem sendo questionada por estudo previamente citado. Estudos clínicos que sugeriram benefício para uso de CQ/HCQ na COVID-19 apresentam nível baixo/muito baixo de certeza, com alto risco de vieses.

Estudos com resultados que sugerem ausência de benefício vem se acumulando mais recentemente, muitos dos quais também com limitações metodológicas. Destacam-se os dois grandes estudos de coorte realizados nos EUA, ambos com grande poder estatístico, a sugerir a ausência de efeito positivo da droga em pacientes hospitalizados. Merece alerta o aumento de paradas cardíacas com uso de HCQ/AZM numa destas coortes e a observação de prolongamento significativo de QT em outro estudo. Com base nas evidências expostas, não se pode inferir ação benéfica da CQ/HCQ na prevenção e tratamento de qualquer fase da COVID-19.

As evidências são, até a presente data, mais desfavoráveis que favoráveis, em que pese a necessidade de mais estudos que permitam conclusões definitivas, especialmente ensaios clínicos bem desenhados. A COVID-19 ainda se encontra no rol de doenças virais sem tratamento medicamentoso específico, muitas delas com formas graves, letais ou complicações ominosas, a exemplo da dengue, zika, chikungunya, febre amarela, ebola, entre diversas outras.

Frisa-se que a maioria dos estudos não avaliou, até aqui, o emprego da droga em fases mais precoces da doença. A suposição de que a ação antiviral de uma droga tenha maior impacto clínico quando usada nos primeiros dias de sintomas, num momento de grande replicação viral, é plausível e encontra eco em outras infecções virais, como naquelas por herpes simples, varicela-zoster e Influenza. Contudo, isto não é um álibi que inverta a lógica científica e favoreça a indicação “até que se prove o contrário”: o ônus da demonstração recai sobre estudos que comprovem a eficácia. Ademais, estudos observacionais recentes, supracitados, desfavorecem a hipótese de que pacientes já em uso de HCQ estejam protegidos da infecção e evolução para gravidade.

A indicação indiscriminada de CQ/HCQ para todos os casos de COVID-19, acarretaria uso massivo da droga na população. Ao incluir todos os casos leves, considerando que a grande maioria não evolui para gravidade, os riscos da droga podem sobrepujar os já incertos benefícios. Por não ser inócua, salienta-se os riscos (em especial, arritmia grave) que podem ocorrer em uma população com perfil de riscos distinto daquelas que são tratadas com a mesma droga para outras condições – idade avançada, doenças cardiovasculares e uso concomitante de outras drogas que aumentam intervalo QT (p.ex. azitromicina) e estado grave/crítico.

Portanto, não se pode extrapolar a experiência de uso limitada a determinadas condições patológicas para a nova população. Além disso, uma eventual indicação precoce de CQ/HCQ enseja uma ainda maior necessidade de realização de testes confirmatórios. De outro modo, haverá prescrição irracional para condições outras que não COVID-19, dada a inespecificidade de muitos dos sintomas, expondo populações a efeitos colaterais sem indicação.

Finalmente, salienta-se que as mais importantes entidades médicas e científicas, nacionais e internacionais (sociedades médicas, instituições de pesquisa, órgãos sanitários e governamentais, editoriais de revistas científicas e hospitais universitátios), até o momento, NÃO recomendam expressamente o uso da CQ/HCQ de rotina para pacientes com COVID-19 fora de estudos experimentais, entre as quais: Sociedade Brasileira de
Infectologia (SBI), Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e Associação de Medicina Intensiva Brasileira22, Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI)23, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)24, Infectious Diseases Society of America (IDSA)25, US Food and Drug Administration (FDA)26 e National Institutes of Health (NIH)27, entre diversos
outros.

7) Recomendação:

Pelo exposto acima, NÃO recomendamos formalmente o uso de cloroquina/hidroxicloroquina, com ou sem azitromicina, para casos confirmados de COVID-19 que apresentem sintomas leves e em fase precoce. Ademais, face às evidências mais recentes, deliberamos a retirada da recomendação para uso da mesma em protocolo para pacientes internados. Estabelecemos pois que, em qualquer fase da doença, o uso torna-se OPCIONAL: compete ao médico a decisão de prescrevê-la, de forma responsável, individualizada e compartilhada com o paciente, mediante termo de  consentimento.

Uma vez prescrevendo, é dever ético do médico expor ao paciente de forma clara as incertezas científicas, isto é, informá-lo da ausência de eficácia comprovada, bem como seus potenciais efeitos colaterais. Desta forma, nos posicionamos contra a elaboração de “kits” de tratamento para COVID-19, sob pena de causar a impressão para médicos e usuários de que há um tratamento de eficácia comprovada, ou mesmo uma cura, desencadeando uma corrida às unidades de saúde.

8) Considerações finais

Estamos diante de uma pandemia sem precedentes na História moderna, que já atingiu a marca de centenas de milhares de mortes no mundo e dezena de milhares no Brasil. Como grupo de médicos infectologistas, estamos atuando direta e indiretamente no atendimento aos pacientes com COVID-19, em todos os níveis de atenção (primária, urgência e hospitalar especializada). É sob esta condição que enxergamos a necessidade de respostas urgentes para a população. Enfatizamos a necessidade de distanciamento social, a única medida por ora comprovadamente eficaz para reduzir casos e mortes.

Enfatizamos a necessidade de ampliar a testagem e fortalecer a rede assistencial, em todos os níveis de atenção, a fim de identificar os casos, prescrever medidas de isolamento, monitorar sinais precoces de agravamento e ampliar a oferta de leitos. A despeito da emergência global, a adoção de medidas terapêuticas não dispensa preceitos mínimos da medicina baseada em evidência. A ciência não é supérflua neste momento, senão o meio que, por excelência, é capaz de dar as respostas urgentes e necessárias; do contrário, sob pena de serem preconizadas medidas danosas e ilusórias à população e desviar o foco dos esforços necessários. Não à toa, centenas de estudos estão sendo semanalmente publicados em todo o mundo. O conhecimento médico que pretende ser alçado à
recomendação deve se basear em dados e estudos, e não em depoimentos de experiência pessoal, divulgados por canais informais.

Nota final:

Face à produção contínua de novas evidências, novas recomendações poderão ser atualizadas a qualquer momento.

Referências:

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18 TANG, W. et al. Hydroxychloroquine in patients with mainly mild to moderate coronavirus disease 2019: open label, randomised controlled trial. BMJ, v. 369, p. m1849, May 2020. ISSN 1756-1833. Disponível em: <
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32409561 >.

19 KONIG, M. F. et al. Baseline use of hydroxychloroquine in systemic lupus erythematosus does not preclude SARS-CoV-2 infection and severe COVID-19. Ann Rheum Dis, May 2020. ISSN 1468-2060. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32381561 >.

20 GENDELMAN, O. et al. Continuous hydroxychloroquine or colchicine therapy does not prevent infection with SARS-CoV-2: Insights from a large healthcare database analysis. Autoimmun Rev, p. 102566, May 2020. ISSN 1873-0183. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32380315 >.

21 ARABI, Y. M. et al. Macrolides in critically ill patients with Middle East Respiratory Syndrome. Int J Infect Dis, v. 81, p. 184-190, Apr 2019. ISSN 1878-3511. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30690213 >.

22 Diretrizes para o Tratamento Farmacológico da COVID-19. Consenso da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, da Sociedade Brasileira de Infectologia e da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, 18 de maio. 2020.

23 Parecer Científico da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI) sobre a utilização da Cloroquina/Hidroxicloroquina para o tratamento da COVID-19 – 18 de maio. 2020.

24 Fundação Oswaldo Cruz – Nota Técnica – Orientações sobre o uso da Cloroquina para tratamento de pacientes  infectados com SARS-CoV-2, agente etiológico da Covid-19. 2020.

25 Infectious Diseases Society of America Guidelines on the Treatment and Management
of Patients with COVID-19. Last updated April 21, 2020 at 12:22 PM EDT and posted
online at www.idsociety.org/COVID19guidelines 2020.

26 U.S. Food & Drugs Administration: Hydroxychloroquine or Chloroquine for COVID-19: Drug Safety Communication – FDA Cautions Against Use Outside of the Hospital Setting or a Clinical Trial Due to Risk of Heart Rhythm Problems – 24 de abril. 2020.

27 National Institutes of Health – Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) Treatment
Guidelines. 2020.

 

Vírion Infectologia
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CRM orienta há dois meses uso de cloroquina na primeira fase da coVID-19

Blog Marco Aurélio D’Eça teve acesso a Ofício encaminhado aos hospitais. ainda em março, pelo Conselho Regional de Medicina do Maranhão, orientando sobre o uso da substância, associada a Azitromicina e Zinco, tendo como alvo principal “pessoas idosas ou portadores de doenças crônicas”

 

Conselho Regional de Medicina orienta uso da cloroquina já na primeira fase da doença, mas só agora se debateu sobre o tema

Uma nova polêmica abriu-se nas redes sociais e na imprensa, desde o fim de semana, após o governador Flávio Dino (PCdoB) publicar informação sobre doação de kits para tratamento da coVID-19, depois retirada de seus perfis.

A partir das notas de Dino – que vinha criticando duramente o presidente Jair Bolsonaro por defender o uso em massa da hidroxicloroquina – iniciou-se uma discussão sobre o uso da substância já na primeira fase da doença, o que seria uma novidade para parte da imprensa.

Mas, na verdade, este protocolo já é usado desde o início da pandemia de coronavírus.

Ou pelo menos deveria estar sendo usado nos hospitais maranhenses.

O blog Marco Marco Aurélio D’Eça teve acesso a Ofício do Conselho Regional de Medicina do Maranhão (CRM-MA), encaminhado, ainda em março, à Prefeitura de Imperatriz, com orientações sobre o uso da Cloroquina já na primeira fase da doença. (Veja print do documento abaixo)

Documento do CRM-MA orienta para início do tratamento com cloroquina já na primeira fase da coVID-19, quando não há inflamação

O documento – o mesmo encaminhado também à Prefeitura de São Luís e ao Governo do Estado – foi atualizado em 1º de maio e orienta sobre o uso da cloroquina associada à Azitromicina e ao Zinco.

– O principal objetivo deste protocolo é sugerir que o tratamento da CoVID-19 seja iniciado o mais precocemente possível, ainda na fase infecciosa, pois no momento em que se inicia a fase inflamatória da doença, a condição do paciente se deteriora rapidamente, e muitos irão precisar de leitos (…) sobrecarregando o sistema de saúde (…) –  diz o protocolo, já em sua abertura.

E qual é esse protocolo usado, repita-se, desde março?

O próprio documento aponta:

– Hidroxicloroquina:  1º dia – 400mg via oral, de 12 em 12 horas. Do 2º ao 7º dia: 400mg via oral ao dia – diz o protocolo, que aponta também azitromicina e zinco associados ao tratamento.

Logo abaixo, o CRM-MA faz uma advertência: o tempo de uso pode variar segundo avaliação médica, podendo ser usado de 5 até 10 dias, conforme o caso.

O documento do CRM-MA serviu, inclusive, como base para dois posts do blog Marco Aurélio D’Eça.

O primeiro., em 7 de maio, denunciava, com base em relatos de pacientes, “preços abusivos de cloroquina em farmácias…”, motivados, segundo as denúncias, pelo confisco de lotes pelo governo do estado.

O outro post – uma reportagem especial – mostrava como o “Maranhão, mesmo contestando, usa cloroquina contra coVID-19…”

O documento do CRM-MA, de oito páginas, assinado pelo Conselheiro Nailton Jorge Ferreira Lyra, discorre detalhadamente sobre estudos dos efeitos da hidroxicloroquina e traz, inclusive, modelo de autorização obrigatória para os pacientes.

No caso específico do Governo do Estado, o próprio Flávio Dino reconheceu o uso conforme a orientação médica, durante a entrevista à TV Mirante, na noite da segunda-feria, 18.

– Há muitas semanas pacientes têm recebido a hidroxicloroquina – frisou ele, dizendo ser estranha a politização deste tema.

– Uma polêmica desnecessária – disse o governador. 

Que ele próprio siga as suas palavras…

 

 

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Apesar de contestar, Maranhão usa cloroquina contra coVID-19…

Blog teve acesso a protocolos oficiais e a depoimentos de profissionais da saúde que confirmam o uso da substância no tratamento da doença, tanto na rede particular quanto nas redes federal, estadual e municipal na Grande São Luís, endossado por recomendações do próprio Conselho Regional de Medicina

Reportagem Especial

Desde o início da pandemia de coronavírus, o governador Flávio Dino (PCdoB) tem feito duras críticas ao uso da hidroxicloroquina no tratamento da coVID-19, sobretudo com ataques ao presidente Jair Bolsonaro, que defende abertamente o uso da substância.  

Mas o que Dino nunca disse à população – nem ele, nem as outras autoridades maranhenses – é que o medicamento faz parte do protocolo da própria rede pública de saúde no tratamento da doença transmitida pelo coronavírus.

A cloroquina é usada tanto em hospitais particulares quanto nas redes federal, estadual e municipal, seguindo o mesmo protocolo determinado pelo Ministério da Saúde e endossado pelo Conselho Regional de Medicina.

Recorte do protocolo do Ministério da Saúde orienta quanto ao uso da Hidroxicloroquina em pacientes da coVID-19

De acordo com o protocolo do MS, a hidroxicloroquina deve ser administrada na quantidade de 400mg, com “um comprimido de 12 em 12 horas, no primeiro dia.”

– A seguir, tomar um comprimido ao dia, até completar 5 dias – estabelece o documento oficial.  (Veja print)

Uso além do determinado 

Mas há na rede pública quem desobedeça este protocolo e vá além na administração da substância, caso, por exemplo, do Hospital da Mulher, unidade-referência da Prefeitura de São Luís para tratamento da coVID-19.   

Farmacêuticas conversam sobre a administração além da conta da hidroxicloroquina em hospital da rede pública

O blog Marco Aurélio D’Eça teve acesso a documentos e depoimentos de profissionais de Saúde que confirmam o uso da substância nesta unidade; e teve acesso também a conversas de profissionais de farmácia, preocupados com a aplicação da cloroquina para além do determinado no protocolo oficial:

– Estamos administrando cloroquina por mais de 10 dias – alerta, preocupada, uma das farmacêuticas do HM.

– Estamos fugindo totalmente do protocolo do MS. Mas não estamos sozinhas. Ollhaaaaa!!! – diz a outra, sem ficar claro o que quer dizer o fim da conversa. (Veja print)

A preocupação dos profissionais de farmácia se dá pelos riscos de administração do medicamento além da média determinada no protocolo, que é de apenas 10 dias. A partir do dia-limite, os riscos são graves, e já levou à morte de diversos pacientes na rede particular. (Entenda aqui e aqui)

Nenhuma das autoridades de saúde no estado admitem oficialmente o uso da cloroquina – resultado da postura crítica adotada publicamente pelo governador do estado – mas todos seguem o protocolo endossado pelo Conselho Regional de Medicina, que, inclusive, encaminhou suas próprias recomendações à rede pública.

Pacientes deveriam consentir

O documento do CRM-MA, a que o  blog Marco Aurélio D’Eça também teve acesso, faz o alerta de que o tempo de tratamento pode variar, mas não pode superar 10 dias.

Documento do CRM-MA orienta hospitais a ministrar cloroquina por 10 dias, no máximo. E exige termo de consentimento do paciente

Em “Recomendação” encaminhada também à rede de saúde de Imperatriz, o conselho cita o Parecer do CFM (Conselho Federal de Mdicina) nº 04/2020, que diz, textualmente: 

– Parecer do CFM nº 04/2020 autorizou a prescrição OFF LABEL da hidroxicloroquina no contexto desta epidemia de covid-19, após consentimento livre e esclarecido. Todos os pacientes devem assinar Termo de Consentimento informado (em, anexo).

O termo Off Label destacado no documento do CRM-MA – ainda sem tradução no Brasil, é a expressão médica para uso de medicamento fora da prescrição prevista em sua bula, ou de medicamento ainda não registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (Saiba mais aqui) 

Tem no hospital; falta nas farmácias

Na semana passada, o blog Marco Aurélio D’Eça publicou post em que pacientes de várias doenças denunciavam preços abusivos da cloroquina nas farmácias de São Luís.

Alguns desses pacientes, acusaram o poder público de ter confiscado estoques da substância, o que gerou a falta nas farmácias.

Nem o governo, nem a prefeitura, nem o Ministério da Saúde se posicionaram oficialmente sobre a denúncia; mas os documentos e depoimentos agora mostram que a rede pública usa, sim, a cloroquina em seus tratamentos.

E isso também pode explicar a falta da substância para quem, de fato, precisa usá-la…

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Clientes denunciam preços abusivos de cloroquina em farmácias…

Produto usado por pacientes de diversas doenças faz parte do protocolo da rede pública de Saúde no tratamento da coVID-19 e passou a sumir do mercado por causa da grande demanda de gente infectada; preço em farmácias de manipulação subiu de R$ 70,00, antes da pandemia, para R$ 420,00

 

As versões do medicamento hidroxicloroquina estão em falta nas farmácias de São Luís, sem previsão de quando voltará ao mercado

Pacientes de doenças como Lúpus e Artrite reumatoide, que são usuários do medicamento hidroxicloroquina denunciam cobrança abusiva do produtos nas farmácias de São Luís.

Na semana passada, um homem chegou a divulgar um vídeo na internet, revelando que a Farmácia Drogasil não tinha o medicamento por que o Governo do Estado havia solicitado todo o estoque para doação.

Este é o homem que espalhou vídeo em aplicativo de trocas de mensagens acusando o governo maranhense de confiscar a cloroquina no mercado

 Em visita a uma das farmácias da rede (unidade Cohama), o titular do blog Marco Aurélio D’Eça foi informado que, de fato, não há a hidroxicloroquina à disposição, mas o atendente não soube informar se houve confisco do governo.

O blog também acionou auxiliares do governo e parlamentares aliados, que negaram confisco ou doação de farmácias.

O perfil do instagram chamado @verdadecovidma publicou horas depois, banner de internet alegando ser fake news a informação de que o governo havia confiscado os estoques do medicamento.

O banner publicado no perfil “verdadecovidma” classificando de fake news a acusação contra o governo Flávio Dino

Nesta quarta-feira, 6, nova denúncia. Uma paciente de lúpus procurou a hidroxicloroquina 400mg na ExtraFarma e na Drogaria Globo e recebeu a informação de que o produto está suspenso por tempo indeterminado.

– Achei apenas na Farmácia Garrido, pelo valor de R$ 420; isso hoje – afirmou a paciente, que encaminhou conversas e áudios ao blog. 

Tanto a rede estadual quanto a municipal têm seguido o protocolo do Ministério da Saúde – endossado pelo Conselho Regional de Medicina – no que diz respeito ao uso da Hidroxicloroquina.

Recorte do Ofício do CRM com o Protocolo de Atendimento para coVID-19 editado pelo Ministério da Saúde e seguido nas redes estadual e municipal 

De acordo com este protocolo, a que o blog teve acesso, a substancia deve ser usada  por “todas as pessoas idosas e portadoras de doenças crônicas que apresentem sintomas gripais”.

Ressaltando que “os melhores resultados ocorrem com tratamento o mais precoce possível”, o protocolo estabelece até 10 dias para o uso da cloroquina. (Veja publicação acima)

Como já se sabe que o número de pacientes está subindo no Maranhão, e a rede pública está usando o produto, é provável que a Hidroxicloroquina continue em falta no comércio.

O que é ruim para pacientes de outras doenças que necessitam do seu uso contante…